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O FENÔMENO DA NOVA ERA NA CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DURANTE A PÓS-MODERNIDADE

Trabalho de Conclusão do Curso de pós-graduação em Ciências Humanas: Sociologia, História e Filosofia.

RESUMO

A presente pesquisa se caracteriza pelo estudo da representação da identidade na população ocidental no contexto do final do século XX e começo do século XXI com ênfase na influência do movimento Nova Era brasileiro. Busca através da leitura da bibliografia analisada compreender o fenômeno do sincretismo cultural que ocorre na construção da identidade do sujeito pós-moderno, percebendo os efeitos que esse provoca nas manifestações religiosas contemporâneas. Levanta-se questões referentes ao contexto cultural contemporâneo e a influência desse na construção da identidade dos sujeitos. O estudo consiste em uma análise da construção de identidades religiosas e/ou de espiritualidade dos sujeitos contemporâneos. A pesquisa identifica a forma de construção da identidade pós-moderna, analisando como a sociedade se comporta, para então, entender como a religiosidade se enquadra nessa construção. É utilizado a obra Modernidade Líquida de Zygmunt Bauman, e A Identidade Cultural na Pós-modernidade de Stuart Hall que serve de material ao presente estudo junto com a publicação de José Guilherme Magnami, O Brasil na Nova Era, que demonstra a normalização do sincretismo religioso no contexto brasileiro. O método de análise dos registros históricos consiste em um tratamento analítico da biografia trabalhada. Resultados serão analisados através da perspectiva da identidade pós-moderna para observar como as fontes significam a construção da identidade religiosa presente em sujeitos contemporâneos.

Palavras-chave: Sociedade; Modernidade Líquida; Identidade; Nova Era; Cultura.​

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ​

BAUMAN, zygmunt. Modernidade liquída. 1 ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.

​ HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 9 ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2004.​

MAGNANI, José Guilherme. O Brasil da Nova Era. 1 ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000

​​​CONCLUSÃO

Nesse artigo é possível perceber com mais clareza o contexto posto na contemporaneidade, como esse influencia na construção da identidade dos sujeitos pós-modernos, e, como o movimento Nova Era deixa transpassar características desse contexto e dessa construção.

Dessa maneira foi possível compreender que no contexto pósmoderno, baseado na teoria do Mundo Líquido de Zygmunt Bauman há uma contínua reformulação dos padrões que vinham ocorrendo durante o período histórico denominado Idade Média, e que essa reformulação tem se intensificado durante o período moderno. Esse período é marcado pela ampliação do público consumidor, alto índice de consumo e um marketing exacerbado.

O contexto contemporâneo é também marcado por ideologias plurais, contraditórias e volúveis, além de uma nova forma de individualismo, que propõe que o indivíduo é o autor e responsável por sua vida e todos os bônus e ônus que ela possa demonstrar.

O período presente e sua história até ele, influenciou e influencia na vida dos sujeitos, as recentes revoluções na história da humanidade auxiliaram na libertação de dogmas e tradições antes existentes e geraram uma ausência de características intrínsecas nos sujeitos, concebendo uma necessidade de definir e reafirmar suas características em todos os âmbitos sociais, principalmente na questão identitária.

Essa nova necessidade se complexifica quando o marketing cria a exigência e desejo de fazer parte dos grupos de consumidores de produtos e serviços em um cenário que se mostra demasiado plural e divergente, que gera contradições nas identificações dos indivíduos.

É nessa conjuntura que percebemos o surgimento do movimento Nova Era, esse que usa do novo individualismo, da grande força de mercado e da autossuficiência, que transpassa certas contradições quando observado através do prisma tradicional, que seleciona características globais/múltiplas na intenção da construção de um novo modo de agir, pensar, sentir e viver. O movimento Nova Era surge como símbolo de uma mudança de paradigma, manipulando com maleabilidade as diversas formas de religiosidade e construindo uma nova forma de conexão com o divino (de espiritualidade).

Após esses apontamentos finais esse artigo cumpre sua proposta de elucidar o contexto contemporâneo, identificando as características desse e seus impactos na formulação da identidade dos sujeitos pós-modernos, e finaliza demonstrando como o movimento Nova Era é uma manifestação de seu tempo. Após tais apontamentos, interessante se mostra um aprofundamento a respeito do movimento Nova Era e suas implicações na vida dos sujeitos ao longo do tempo.​​​

​​​O MOVIMENTO NOVA ERA DEMONSTRA MUDANÇAS NA FORMA DE CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DOS SUJEITOS NA PÓS-MODERNIDADE

   O movimento Nova Era é um fenômeno considerado recente na história. Uma das características desse movimento é o que se convencionou chamar de contracultura. É considerado por muitos como sendo o início de uma nova religião, a “religião Nova Era”, uma adaptação ou tradução pós-moderna onde o praticante é seu próprio oficiante, estando nessa característica central um dos pilares da vida contemporânea, onde os indivíduos se tornaram mais autônomos em relação as instituições sociais. (MAGNANI, 2000) Esse é um fenômeno possível de identificar em todo o globo terrestre, mas nesse artigo tomarei como foco o caso de tal movimento no território brasileiro.

   Esse movimento tem como um dos aspectos utilizar de religiões orientais e indígenas, do espiritismo, de terapias alternativas, da psicologia transpessoal, da ecologia, da astrologia, do gnosticismo e de outras correntes religiosas, de misticismo e de ocultismo, normalmente as misturando e ressignificando e proclamando o início de uma nova era para a humanidade.

   Magnani descreve a origem da expressão Nova Era proveniente da cosmologia astrológica, referindo-se a uma mudança “ocasionada pela chamada precessão dos equinócios”. (MAGNANI, 2000, p.9) De acordo com essa teoria, se inicia uma nova era de aquário que anuncia mudanças para a humanidade, na sua forma de pensar, sentir, agir e se relacionar com os outros, a natureza e o sobrenatural. Mesmo entre os adeptos dessa teoria há controvérsias se já estamos nessa nova era, ou nos preparando para adentrá-la. (MAGNANI. 2000)

   No âmbito espiritual a contracultura do século XX expandiu os horizontes da cultura bíblica e protestante à filosofia e religiões orientais, o que influenciou e influencia uma abertura no âmbito da religião às gerações Z e Y que comumente preferem usar o termo espiritualidade, por não estar normalmente vinculada a uma seita religiosa, e quando sim, a adapta. (MAGNANI, 2000)

   No Brasil o misticismo, o ocultismo e o pluralismo de religiões sempre existiram, mas esses vem crescendo e saindo das margens da sociedade e se instalando em todos os setores, durante os séculos XIX e XX muitas práticas deixaram paulatinamente de serem mal vistas e fizeram parte oficialmente do arcabouço místico, ocultista e religioso do território. Foi também em meados do século XX que práticas como a acupuntura, as artes marciais e o yoga começaram a se difundir. (MAGNANI, 2000)

   Foi apenas no final da década de 1980 e decorrer da década de 1990 que a temática começou deixar de ser vista como “coisa de hippie” e começou se consolidar e diversificar, usando da tendência global e ganhando proporção de mercado. Para Magnani “... a expressão Nova Era atualmente é empregada para designar um leque de tendências mais amplo que aquele inicialmente surgido na sequência da contracultura e do movimento do Potencial Humano.” (MAGNANI, 2000, p.25) Ele aponta também em seu estudo, considerando o contexto paulistano, que a localização geográfica desses cultos e práticas neo-esotéricas se concentram em bairros onde estão as camadas médias da população.

   Assim podemos perceber que a camada da sociedade que mais rápido se adaptaram à globalização, as camadas médias e com alto grau de escolaridade, são as que mais utilizam de terapias e vivências tidas como nova era. Por essa ser a que mais desfruta dessa sociedade de mercado devido seu maior poder aquisitivo, é intuitivo que sejam os que mais delas disfrutem. Os adeptos dessas práticas e terapias não costumam se autodenominarem participantes de tal grupo, mas sim, aderem as práticas; esses são os indivíduos, que assim como o mundo líquido de Bauman e a teoria de sujeito pós-moderno de Stuart Hall mantem suas fronteiras fluídas e não enrijecidas.

   Além do mais, “Não é nada incomum que praticantes de outros credos somem à sua devoção práticas e crenças típicas da Nova Era, como a consulta aos oráculos, utilização de cristais, leitura de obras de auto-ajuda, energizações, o que evidentemente intensifica o fluxo nesse sistema de troca inter-religioso”. (MAGNANI, 2000, p.50)

   Uma das conclusões que Magnani chegou com sua obra é que

   Após algumas reflexões acerca da obra de José Guilherme Magnani percebemos que o movimento Nova Era é um fenômeno social recente e que exprime comportamentos presentes no contexto que os sujeitos habitam, seja o amplo impacto do mercado na vida dos indivíduos (consumidores), seja na reformulação de seus ideais, princípios, ideologias, tradições e dogmas, que são construídos, reconstruídos e precisam ser reafirmados continuamente.​​​

​​​A INFLUÊNCIA DO CONTEXTO NA CONSTRUÇÃO DE IDENTIDADES

   A modernidade fez emergir uma nova forma de individualismo que libertou os sujeitos das tradições e deu espaço para um “indivíduo soberano”, isso no contexto do Humanismo renascentista do século XVI e do Iluminismo do século XVIII, sendo que as revoluções contribuíram para essa libertação. A Reforma e o Protestantismo contribuíram para libertar as consciências individuais das instituições religiosas e colocar o ser humano em contato direto com Deus; O Humanismo renascentista colocou os Humanos no centro do universo; As revoluções científicas deram a capacidade aos humanos para inquirir, investigar e decifrar os mistérios da Natureza; e o Iluminismo centrado na Humanidade racional auxiliou na libertação de dogmas e preconceitos. (HALL, 2004)

   Essa fase que tem a individualização e a pluralidade em evidência, onde os sujeitos têm a necessidade de construir ou reafirmar sua identidade, essa que agora é construída e não mais predestinada com base em características herdadas, mesmo a classe social que o sujeito possui no nascimento precisa ser afirmada e reafirmada ao longo do tempo.

A globalização não é um fenômeno recente e vem ocorrendo durante toda a modernidade, se intensificando paulatinamente, principalmente após a década de 1970, percebemos que esse processo está deslocando as identidades culturais, incluso das identidades culturais nacionais. Ele atravessa as fronteiras nacionais e promove uma ampla interconexão entre os diversos territórios, alterando as identidades culturais. (HALL, 2004)

   A atual forma de constituir a identidade tem se modificado intensamente e constantemente junto com o mundo contemporâneo, Stuart Hall traça uma linha de desenvolvimento da concepção de identidade, iniciando com o “sujeito do iluminismo”, um indivíduo centrado e unificado, racional, dotado de consciência e de ação, um sujeito que nascia pleno e se aprimorava e se desenvolvia, mantendo sua essência inicial; passando pelo “sujeito sociológico”, uma concepção interativa da identidade do eu, que considerava que a identidade é construída através das relações sociais que esse estabelece, as tradições herdadas e a cultura que esse está inserido; até chegar na concepção do “sujeito pós-moderno”, esse que não possui uma identidade essencial ou permanente, e sim uma identidade formada e transformada constantemente. (HALL, 2004)

   Esse sujeito pós-moderno “assume identidades diferentes em diferentes momentos, identidades que não são unificadas ao redor de um eu coerente” (HALL, 2004, p.13), nesse, “há identidades contraditórias, empurrando em diferentes direções, de tal modo que nossas identificações estão sendo continuamente deslocadas.” (HALL, 2004, p.13)

Stuart Hall descreve três consequências do aspecto globalizante sobre as identidades culturais, são elas, a desintegração das identidades nacionais, resultado do “crescimento da homogeneização cultural e do pós-moderno global” (HALL, 2004, p.69); o reforço de identidades nacionais locais ou particularistas em resistência à globalização; e o declínio das identidades nacionais e a construção de identidades híbridas. (HALL, 2004)

   Essa mudança no âmbito da identidade é fruto de seu tempo, percebemos que um mundo globalizado, marcado por rápidas, constantes e permanentes mudanças gerou um impacto sobre a identidade cultural. Hoje é impossível ligar o rádio, o televisor, rolar a timeline de uma rede social, fazer compras, assistir uma plataforma de streaming sem se deparar com um enorme catálogo cultural; uma música, um filme, uma série, uma roupa de loja de departamento, uma tendência ou notícia que ocorre em qualquer parte do planeta se torna disponível para qualquer indivíduo que esteja conectado ao mundo globalizado.

   Esse bombardeamento informacional, muitas vezes com filtros pouco meticulosos, influencia na construção das identidades dos indivíduos, nesse sentido, os hábitos ou identificações que antes provinham dos parentes ou de indivíduos que faziam parte do convívio social próximo, agora, em um contexto globalizado essa influência pode vir de qualquer pessoa ou empresa de qualquer parte do planeta, e num tempo recorde. Além do mais a sociedade de consumo amplia as opções e usa do marketing para interiorizar nos indivíduos o desejo em fazer parte de um grupo consumidor de um produto ou serviço.

O CONTEXTO CULTURAL CONTEMPORÂNEO

   Para compreender o cenário atual me debrucei sobre a obra filosófica de Zygmunt Bauman, Modernidade líquida, onde o autor faz uma ampla discussão na busca de compreender o período que ele chama de pós-modernidade, modernidade líquida ou modernidade tardia. Ele localiza esse período como um mundo que segue o modelo “pós-panóptico”, fazendo alusão do modelo panóptico que foi teorizado por Michel Foucault e que apresenta diversas desvantagens no que se refere a sua aplicação e manutenção. Nesse modelo “pós-panóptico”, o espaço físico não faz mais parte das engrenagens de comando, nesse contexto, pós popularização dos meios tecnológicos como o smartphone, os donos do poder lançam as ordens sem a necessidade de uma estrutura física que é custosa e exige complexa manutenção (BAUMAN, 2001).

   Hoje os poderes, ou seja, as elites globais, almejam o desmoronamento das fronteiras, tanto territoriais como culturais, pois assim o controle, e a abrangência dessas não se mantém limitado. Uma das formas de se obter esse desmoronamento das fronteiras, ou melhor, essa ideia de ausência delas é a intensificação do processo de globalização; a locomoção física e cultural entre as diversas regiões do globo terrestre faz com que o leque de escolhas das pessoas seja ampliado e isso é usado como uma tática para que essas se sintam mais livres e, portanto, não tenham como objetivo lutar por mais liberdades. (BAUMAN, 2001)

   Bauman afirma que a liquefação da modernidade acontece desde seu princípio e se intensifica na contemporaneidade, essa liquefação, segundo Bauman, ocorreu com o intuito de construir uma sociedade mais sólida, uma nova ordem principalmente definida nos termos econômicos (2001). O autor afirma que “... a situação presente emergiu do derretimento radical dos grilhões e das algemas que, certo ou errado, eram suspeitos de limitar a liberdade individual de escolher e de agir.” (BAUMAN, 2001, p. 12). Ou seja, a modernidade líquida ou pós-modernidade, é uma reformulação fluida dos moldes que delimitavam as ações/escolhas possíveis dos sujeitos.

   Mas por se tratar de uma reformulação dos moldes como o mundo era organizado, essa nova configuração trouxe consigo uma formatação própria, principalmente na ordem econômica, sendo que “A tarefa dos indivíduos livres era usar sua nova liberdade para encontrar o nicho apropriado e ali se acomodar e adaptar: seguindo fielmente as regras e modos de conduta identificados como corretos e apropriados para aquele lugar.” (BAUMAN, 2001, p.14). Sendo assim, essa nova reformulação fez com que os indivíduos que antes estavam à margem da sociedade pudessem dela fazer parte, consumindo seus bem e produtos e movimentando a economia, conforme as novas regras então estabelecidas.

   Ainda em busca de entender como o contexto atual se apresenta continuo com Bauman que descreve queHoje, os padrões e configurações não são mais “dados”, e menos ainda “autoevidentes”; eles são muitos, chocando-se entre si e contradizendo-se em seus comandos conflitantes, de tal forma que todos e cada um foram desprovidos de boa parte de seus poderes de coercitivamente compelir e restringir. E eles mudaram de natureza e foram reclassificados de acordo: como itens no inventário das tarefas individuais. Em vez de preceder a política-vida e emoldurar seu curso futuro, eles devem segui-la (derivar dela), para serem formados e reformados por suas flexões e torções. Os poderes que liquefazem passaram do “sistema” para a “sociedade”, da “política” para as “políticas de vida” – ou desceram do nível “macro” para o nível “micro” do convívio social (BAUMAN, 2001, p. 15).

   Percebemos ao ler a obra de Bauman que ele se refere a uma fase histórica onde a individualização é parte central. Essa individualização que produziu a ideia de que todos tem problemas e que esses problemas devem ser resolvidos de forma individual, o comércio de autoajuda, que populariza dicas de como os resolver é presente, mas a responsabilidade ainda cabe apenas aos indivíduos, sem observar a causa social desses problemas. (Bauman, 2001)

   Ainda na teoria da modernidade liquida de Bauman o capitalismo é uma das explicações para essas mudanças; em sua fase anterior, uma fase do então denominado "capitalismo pesado” o modelo fordista é que vigorava, era um modelo baseado em uma organização centralizada na ordem e no progresso, com estruturas e uma cadeia de comando explicita. Já no modelo do “capitalismo leve”, que não é mais fixado no espaço, e sim utiliza de equipamentos portáteis, possui dois tipos de habitantes, uns que se movimentam constantemente pelo mundo e outros que percebem o mundo se mover ininterruptamente. (Bauman, 2001)

   Nesse mundo atual, poucas coisas são predeterminadas e incontáveis são as possibilidades, os líderes se tornam cada vez mais amigáveis e sedutores, para que consigam se manter no poder, há também um crescimento na quantidade de conselheiros, esses que comumente são denominados influenciadores, mas que continuam no grupo dos liderados; esses influenciadores são os responsáveis por impulsionar a roda do comércio, trazendo constantemente para o ambiente público objetos de desejo, sendo eles bens materiais e ideologias.

   Esse mundo contemporâneo, onde as opções de consumo são infinitas, onde os mercados de consumo não são apenas físicos mas também digitais, onde as propagandas que geram sempre desejos de consumo são carregadas na mão de cada um dos indivíduos com um smartphone, induz cada vez mais a uma compulsão pelo consumo, uma compulsão que se torna um vício, e como os vícios, por eles não se é possível saciar. Esse consumo é extrapolado facilmente do universo material, o que impulsiona um conflito de identidade.

   Essa sociedade também gera uma necessidade de estar apto e saudável, seja para consumir ou para o trabalho, o que produz um consumo também em torno disso. Além do mais, essa busca por aptidão não tem fim e os centros de estética e bemestar se tornam ambientes de consumo regular.

   Após os apontamentos de Bauman podemos perceber que o contexto que os indivíduos contemporâneos habitam é um ambiente instável, onde as regras de convívio são diversas, mutáveis e heterogêneas, assim, a construção da identidade desses sujeitos não está previamente definida e esses a fazem constantemente se aproveitando de tendências e influências externas.

INTRODUÇÂO

   Para compreender a formação da identidade nos sujeitos pós-modernos é necessário iniciar com o contexto histórico que esses habitam, para isso, será utilizada a teoria da modernidade líquida de Zýgmunt Bauman, que descreve que no mundo líquido (metáfora utilizada para caracterizar a ausência de estabilidade do período), tem como uma de suas principais características a intensa transformação decorrente da submissão a tensão, essa que é constante no mundo contemporâneo, marcado pela fluidez, ou seja, não se mantém com a mesma forma por muito tempo.

   Levanta-se algumas questões centrais nesse trabalho sobre, como se comporta o contexto cultural contemporâneo? Qual(ais) a(s) influência(s) desse na construção de identidades? E como o fenômeno do movimento Nova Era demonstra mudanças na forma de construção da identidade dos sujeitos na pós-modernidade?

   Esse trabalho tem como objetivo focar em questões de identidade desses sujeitos, sujeitos que Stuart Hall em seu livro A identidade cultural na pósmodernidade afirma que anteriormente eram unificados e hoje são fragmentados. Ele afirma haver uma crise de identidade que muito tem sido analisada e que essa “é vista como parte de um processo mais amplo de mudança, que está deslocando as estruturas e processos centrais das sociedades modernas e abalando os quadros de referência que davam aos indivíduos uma ancoragem estável no mundo social.” (HALL, 2004, p. 7).

   Aproximando-se do que Bauman descreve como sendo uma reformulação dos moldes sociais, Hall fala de uma mudança estrutural que vem “fragmentando as paisagens culturais de classe, gênero, sexualidade, etnia, raça e nacionalidade, que, no passado nos tinha fornecido sólidas localizações como indivíduos sociais” (Hall, 2004, p.9) e na pós-modernidade vem forjando indivíduos que não tem uma identidade fixa, essencial ou permanente.

   Delimitando um pouco mais o objetivo desse ensaio sobre a questão da identidade, essa que é “formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam” (Hall, 2004, p.13) é possível observar um fenômeno que tem sido chamado de Nova Era, neo-esoterismo, misticismo contemporâneo, ou era de aquário, esse é um fenômeno novo, ou melhor, um fato social gerador de comportamentos coletivos novos.

   Portanto, o presente artigo tem como objetivo geral um estudo da identidade da população ocidental no contexto do final do século XX e início do século XXI, e como objetivos específicos refletir sobre a influência do contexto cultural contemporâneo na construção da identidade, buscar entender o fenômeno do sincretismo cultural na formulação da identidade dos indivíduos pós-modernos e seus efeitos nas manifestações religiosas contemporâneas, com ênfase no movimento Nova Era.

   Como metodologia utilizada no presente artigo usa-se de uma análise bibliográfica reflexiva dos autores trabalhados, correlacionando os conceitos de Zygmunt Bauman da “Modernidade líquida” com a concepção de “sujeito pósmoderno” de Stuart Hall para buscar compreender e refletir sobre o movimento Nova Era estudado pelo autor José Guilherme Magnani.

   O artigo se estrutura numa divisão de três momentos, definindo o contexto, explorando como esse influencia na construção da identidade dos indivíduos e finalizando com reflexões acerca do movimento nova era, buscando perceber como esse exprime mudanças no ato de construir a identidade dos sujeitos contemporâneos.

   Sendo assim, esse artigo tem relevância social por propiciar uma reflexão acerca da construção da identidade e do fenômeno do movimento Nova Era que vem modificando as práticas de religiosidade e espiritualidade dos indivíduos contemporâneos.​​​

David de França Brito

o fenômeno da Nova Era está, sim, relacionado a modificações que vêm ocorrendo no campo dos comportamentos e das práticas religiosas contemporâneas, mas não constitui uma religião específica (ao menos no molde eclesiástico), pois não se encaixa em seu formato canônico, com hierarquia, dogmas, culto organizado, doutrina revelada. Insere-se nesse campo porque abre espaço e condições para o exercício de novas formas de manifestar o sentimento religioso. Nesse sentido inclui, favorece e desenvolve aspectos de religiosidade, pois em muitos de seus arranjos há ritos e celebrações como forma de expressão coletiva da experiência religiosa. E certamente incorpora o elemento da espiritualidade, entendida como forma mais individualizada de expressar a vivência do sagrado em seu sentido mais amplo. (MAGNANI. 2000. p.52)

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